O Equilíbrio Através da Filosofia Chinesa

16 Set

O equilíbrio através da filosofia chinesa, explicado por Sonia Hirsch em seu livro “O Manual do Herói”.

Yin Yang

Yin e Yang não são forças opostas e distintas, mas qualidades inseparáveis de um mesmo processo

Tudo o que se quer entender carece de um mínimo de arrumação. Os chineses de antigamente, muito apaixonados pela observação e classificação dos fenômenos da natureza, arrumaram o mundo primeiro em yin e yang, a quietude e o movimento, o sombrio e o luminoso, o vazio e o cheio, a água e o fogo.

Essa forma de pensar, a princípio estranha, se torna simples e vigorosa quando nos acostumamos com ela – ou melhor, quando percebemos que você joga a bola para cima e enquanto há impulso ela sobe, e isto é yang; acabado o impulso ela pára de subir e cai, e isto é yin.

Yang: movimento. Yin: quietude. Nada é yin ou yang o tempo todo. Quando um movimento atinge sua expressão máxima, se transforma no outro. Como uma onda no mar, que começa devagarinho, vai crescendo, mostra sua força, atinge seu máximo – e quebra, deixando despencar aquele monte de água e espuma. Como o sol que vai subindo no céu até ficar a pino, e então começa a descer. Yin e yang refletem as mutações contínuas do próprio universo e nos dão a chave para compreender uma realidade sempre relativa, cheia de novidades e surpresas, e entretanto constante em seus ciclos temporais.

Durante muito tempo foi assim; yin e yang, em sua infinita flexibilidade, eram o modo oficial do pensamento. Mas aos poucos foi aparecendo, e finalmente se escancarou há cerca de três mil anos, uma outra forma de arrumar o mundo – sempre compatível com yin e yang, mas definida em cinco setores que abrangem simplesmente tudo.

A Estrela de cinco pontas

Por que cinco e não quatro ou seis? Porque esses novos pensadores prestaram muita atenção a certos detalhes. Por exemplo: os pontos cardeais, que sempre se diz que são quatro, para eles são cinco – norte, sul, leste, oeste e centro. Pois que seria das direções se não houvesse um centro como ponto de partida? Outro detalhe: as estações do ano. Onde todo mundo viu quatro eles viram mais uma, o final do verão, que tem características de todas as estações e se faz notar também, embora menos intensa, no final da primavera, do outono e do inverno.

No funcionamento do corpo humano perceberam cinco órgãos fundamentais, cada qual constituindo, com seu meridiano, um centro sutil de energia: fígado, coração, baço, pulmões e rins. Viram que esses órgãos atuam em parceria com cinco outros: vesícula biliar, intestino delgado, estômago, intestino grosso e bexiga. Notaram que cada um dos cinco setores é mais sensível a um tipo de clima: vento, calor, umidade, secura ou frio. Mais ativo num período do dia: manhã, meio-dia, tarde, anoitecer ou noite. Favorece diferentes atitudes: planejamento, comunicação, reflexão, ordenação, vontade. E traz consigo um sabor – ácido, amargo, doce, picante ou salgado – que vai influir decisivamente na nossa vida, já que sua presença reforça, sua ausência enfraquece e seu excesso desequilibra a energia daquele setor dentro de nós.

Essa arrumação do mundo em cinco partes é representada por uma estrela de cinco pontas, cada uma das quais recebe o nome do elemento natural que mais se identifica com aquela maneira de ser.

Água para a energia que é fria, fluida, pesada, escura, yin.

Madeira para a energia morna que brota, sobe, ocupa e determina espaços – o começo do movimento, yang.

Fogo para a energia quente, leve, luminosa e exuberante que se espalha com facilidade: yang.

Terra para a energia neutra sobre a qual tudo repousa, estabilizadora, receptiva.

Metal para a energia fresca e seca que desce, concentra, contrai – o começo do yin.

Mas o mundo gira e a estrela roda e rodando constrói um ciclo, um círculo, um mundo redondo em que tudo muda o tempo todo. Água se transforma em Madeira, Madeira se transforma em Fogo, Fogo se transforma em Terra, Terra se transforma em Metal, Metal se transforma em Água. O movimento nasce, cresce, atinge o alto, desce, morre, renasce, tudo legitimamente yin e yang. São apenas um modo fácil de simbolizar o processo; não dão a idéia visual exata, porque Terra deveria estar sempre no centro, mas quebram o maior galho, e você logo verá por quê.

Os chineses expressam estes momentos da seguinte forma:

O leste cria o vento. O vento cria a madeira. A madeira cria o sabor ácido. O sabor ácido nutre o fígado; o fígado nutre os músculos; os músculos fortalecem o coração; e o fígado governa os olhos. Os olhos vêem a escuridão e o mistério do Céu e descobrem Tao, o caminho.

Do sul vem extremo calor. Calor produz fogo e fogo produz o sabor amargo. O sabor amargo nutre o coração, o coração nutre o sangue e o sangue dá vida ao estômago. O coração reina sobre a língua.

Do centro vem a umidade que cria a terra e a terra cria o sabor doce. O sabor doce nutre o baço, que nutre as carnes que fortalecem o pulmão. E o baço governa a boca.

O oeste engendra a secura que produz o metal. O metal cria o sabor picante e o sabor picante nutre o pulmão. O pulmão nutre a epiderme que fortalece os rins, e governa o nariz.

O norte cria o frio; o frio produz a água; a água gera o sabor salgado; o sabor salgado nutre os rins; os rins nutrem os ossos e as medulas, que fortalecem o fígado; e os rins governam as orelhas.

Os ciclos dos Elementos
As pontas da estrela representam os momentos de transformação dentro do ciclo

Os ciclos dos 5 Elementos

Você reparou que um setor nutre e fortalece o outro? Mais que isso: um setor integra o outro, tem conseqüências no outro, sofre as conseqüências de outro, exatamente como tudo o que existe no universo. Como nós tendemos a ver as partes isoladas, fragmentadas, às vezes é muito difícil compreender a dinâmica das interações nessa história. Não se afobe. O inconsciente também trabalha. Trocando tudo em frases curtas, o jogo simbólico fica assim:

Madeira queima, produzindo Fogo, de cujas cinzas se forma a Terra, e dentro dela se condensa o Metal que expulsa de si a Água, da qual brota Madeira. Ou seja: Madeira nutre Fogo, que gera Terra, que engendra Metal, que gera Água, que nutre Madeira, ou seja ainda: uma ponta dá energia para a outra, permite que a outra aconteça. Este é o ciclo de geração de energia.

Mas a Água apaga o Fogo, que funde o Metal, e Metal corta a Madeira, que esgota a Terra, e Terra absorve a Água, não é? Pois então, herói, este é o ciclo de dominação da energia. Significa que Madeira controla Terra, Terra controla Água, Água controla Fogo, Fogo controla Metal, Metal controla Madeira.

Também é possível que Madeira ofenda Metal, Metal ofenda Fogo, Fogo ofenda Água, Água ofenda Terra e Terra ofenda Madeira, assim como qualquer escravo pode se voltar contra seu senhor, e este é o ciclo perverso.

De qualquer modo, as cinco pontas têm sempre uma relação dinâmica entre si que não deixa nenhuma de fora: Água nutre  Madeira, é nutrida por Metal, controla Fogo, é controlada por Terra. Madeira nutre Fogo, é nutrida por Água, controla Terra, é controlada por Metal. Fogo nutre Terra, é nutrido por Madeira, controla Metal, é controlado por Água. Terra nutre Metal, é nutrida por Fogo, controla Água, é controlada por Madeira. Metal nutre Água, é nutrido por Terra, controla Madeira, é controlado por Fogo.

Quando um elemento predomina, por exemplo em determinados horários ou estações do ano, é chamado imperador: o mais ativo. O que é nutrido por ele se chama ministro: está perto, desperto. O que gerou é a mãe: repousa, esgotada. O controlado por ele é inimigo vencido: não ousa. O que controla seu poder é conselheiro: modera.

Extraído do livro “Manual do Herói” ou a Filosofia Chinesa na Cozinha, de Sonia Hirsch, 1990, 2ªed.

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